sexta-feira, 7 de novembro de 2008

Alexandre Soares Silva

Alexandre Soares Silva é o melhor blogueiro brasileiro. Junto com Diogo Mainardi, Soares Silva é a pessoa que mais entende de literatura inglesa no Brasil. João Pereira Coutinho lembra muito o estilo do Alexandre Soares Silva.
Alexandre é brilhante escrevendo tanto sobre literatura quanto sobre politica. De tudo o que foi publicado sobre a eleição de Obama, paradoxalmente, o melhor texto foi escrito em 2003 por Soares Silva. O texto trata do antiamericanismo difuso na sociedade. Segue abaixo o texto.
Alexandre Soares Silva
Antiamericanismo
O antiamericanismo é o antisemitismo moderno. As pessoas vêem filmes de nazistas e acham aquilo absurdo, como se não fossem capazes de sentir a mesma coisa. Mas são. Simplesmente aprenderam que o antisemitismo é feio, e escolheram outro povo pra odiar.
Não é político. Eles podem dizer que odeiam Washington, não o povo americano; mas na mente e nos jornais deles Bush virou uma caricatura tão vil quanto a que os nazistas faziam dos judeus. E toda a imagem que fazem dos americanos - gordura, hambúrguer, serial killers - é racista. E o jeito com que pessoas (que se consideram boas) comemoraram a kristallmorgen de 11 de setembro! Prevejo Daschaus contra americanos – celebradas por franceses em livros que serão resenhados favoravelmente pela Caros Amigos e pela Folha também, e pela TV Cultura. E a capa da Veja será, Eles Fizeram Por Merecer. Ou talvez A Fúria Justa.
A diferença, dizem eles, é que os judeus foram vítimas inocentes, os americanos são culpados vis. Como se os nazistas não se achassem vítimas da opressão judaica. Era exatamente assim que se achavam: vítimas da opressão judaica. Não há diferença entre o ódio de Eichmann e o ódio de José Arbex. Havia uma suposta opressão cultural - o intelectualismo judeu antes, o infantilismo americano agora - e uma suposta opressão político financeira - os marionetes judaicos em Washington antes, e os marionetes americanos em Israel agora. As duas expressões antisemitas em itálico são de Goebbels e Hitler. As duas expressões antiamericanas em itálico estão nos jornais todos os dias.
Olhem, a romancista Margaret Drabble escreveu isto num
jornal:
"My anti-Americanism has become almost uncontrollable. It has possessed me, like a disease. It rises up in my throat like acid reflux, that fashionable American sickness. (…)There, I have said it. I have tried to control my anti-Americanism, remembering the many Americans that I know and respect, but I can't keep it down any longer. I detest Disneyfication, I detest Coca-Cola, I detest burgers, I detest sentimental and violent Hollywood movies that tell lies about history. I detest American imperialism, American infantilism, and American triumphalism about victories it didn't even win."
Agora substituam antiamericanismo por antisemitismo, americanos por judeus. Fica mais ou menos assim:
“Meu antisemitismo se tornou quase incontrolável. Ele tomou conta de mim, como uma doença. Ele sobe na minha garganta como refluxo gástrico, essa doença judaica da moda. Pronto, eu disse. Tentei controlar meu antisemitismo, lembrando de vários judeus que eu conheço e respeito, mas não consigo me controlar mais. Detesto todo tipo de talmudização da cultura, detesto bagels, detesto falafels, detesto a arte degenerada dos pintores judeus, que mentem sobre a natureza humana. Detesto o cartel judaico, a esperteza judaica, e a alegria dos judeus a respeito de um domínio político-financeiro na Europa, quando na verdade esse domínio pode muito bem ser revertido se agirmos a tempo.”
Tudo o que fiz foi trocar um povo pelo outro, um clichê pelo outro, e uma paranóia pela outra. Se a segunda versão parece muito mais horrível do que a primeira, é porque agora é ok odiar os americanos, está liberado. Não era assim que os alemães se sentiam em relação aos judeus?
Realmente acho que se algum dia houver uma juventude hitlerista (claro, com outro nome) no Brasil, contra os americanos, ela vai buscar membros através da MTV e da revista Trip. Raspe a canela e o tênis de um jovem numa passeata, e verá que é um trompe-l´oeil pintado sobre botas.

Um comentário:

Rede Comunicação disse...

A vitória de Obama representa a esperança em que os americanos se tornem outras pessoas, menos "americanas". O mundo aprendeu a criticar sua cultura e odiar seus hábitos sem sequer conhece-los a fundo.
Tomara que Obama os transforme em um outra população.